Religiosidade popular, um tesouro da Igreja
Com Deus eu me deito, Com Deus eu me levanto, Com a graça divina do Espírito Santo.
Em nossas terras brasileiras, três universos culturais se encontram: o indígena, o europeu e o africano. A história nos mostra as convergências e divergências, mas acima de tudo a beleza da diversidade cultural. A religiosidade não poderia ficar fora desse processo. Maneiras distintas de compreender o mundo, o homem e Deus resultaram um impressionante sincretismo. A mistura destas etnias, com suas tradições populares religiosas, exerceu uma influência significativa sobre a fé, sobretudo no catolicismo nascente. Nesses cinco séculos de Igreja Católica nesse continente, essas expressões simples da fé do nosso povo pobre caminharam quase que paralelamente à Igreja oficial. Houve por muito tempo um preconceito, um descrédito da parte da hierarquia. Com o Concílio Vaticano II é inaugurado um novo tempo eclesial. A Igreja latino-americana redescobre seu povo, sua contribuição para a realização do Reino de Deus. São João Paulo II, quando esteve no Brasil em 1980, disse que “a religiosidade popular é a expressão de uma dimensão profunda do homem. É a própria alma do povo que aflora nas expressões e manifestações de piedade, algumas de grande singeleza. No mais profundo da religiosidade popular encontra-se sempre uma verdadeira fome do sagrado e do divino.” Com toda certeza, a piedade popular já santificou muita gente. O documento de Aparecida nos aponta algumas reflexões, porém um pouco tímidas. Aborda essa temática como “tesouro da Igreja Católica na América Latina”. Daí que todos são convidados a promovê-la e protegê-la. “É uma espiritualidade encarnada na cultura dos simples.” No entanto a maneira como a religiosidade popular foi tratada no Documento de Aparecida nos coloca diante de vários desafios pastorais. Como integrar piedade popular nas nossas liturgias? Como purificá-las? São questões obscuras ainda. Enfim, devemos superar o preconceito e a ignorância acerca da espiritualidade popular. Sem sombra de dúvidas, é uma maneira autêntica de vivência da fé. Deus tem suas maneiras de seduzir o coração humano. Seria muita pretensão engessar a revelação divina numa liturgia, numa teologia dita “oficial”. A simplicidade do povo também cria celebrações, cria teologias, e é claro, fraterna experiência transcendental transformadora.
Pe. Paulo Morais, C.SS.R. Curvelo/MG