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Predestinados para o Amor


A perspectiva cristã afirma que a vida de cada ser humano não é fruto do acaso ou de algum acidente, mas tem sua origem no desígnio amoroso de Deus Criador. Nossa vida é dom de Deus e a Ele pertence. Não importa de que forma viemos a este mundo, se fomos desejados desde o princípio por nossos pais ou se a nossa chegada não foi planejada, nem desejada, consequência de relações mal vividas. Importa que desde sempre fomos amados por Deus e chamados a realizar uma missão específica neste mundo. O salmista expressa esta verdade com certo assombro: “Todos os meus dias estavam modelados, ainda antes que um só deles existisse” (Sl 139,16). Nascemos do amor e caminhamos para a Pátria definitiva do Amor, que é a própria vida divina. Entre o início e o fim de nossa vida, somos convidados a viver um projeto de amor que é a nossa própria história. Desde o princípio de sua vida, o ser humano sente-se envolvido, conduzido e impulsionado por este mistério que o abarca. Pode-se dizer que há uma predestinação originária do ser humano para o amor. Aqui, não se deve entender “predestinação” como um destino fechado e já dado, no qual simplesmente “atuamos”, mas seria melhor entendê-la como “destinação”, “chamado”, porque aqui se trata de um apelo a nossa liberdade, a capacidade de decidirmos ou não por este projeto de Amor. A vocação é a nossa resposta a este sonho de Deus para nós, é uma resposta ao dom originário do amor, que é a nossa vida. Este projeto é único e irrepetível, porque única e irrepetível é cada vida humana que vem a este mundo: “Sou chamado a fazer ou ser algo para o qual mais ninguém é chamado; no plano de Deus e nesta terra de Deus, ocupo um espaço que ninguém mais pode ocupar. Seja eu rico ou pobre, desprezado ou honrado pelos outros, Deus conhece-me e chama-me pelo meu nome” (Beato John Henry Newman). Esse projeto originário de Deus pode ser vislumbrado concretamente na vida de Jesus Cristo, pois em seu Filho, Deus escreveu a nossa história: “Ele nos escolheu em Cristo antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis na sua presença, no amor” (Ef 1,4). Jesus é o “excesso” do que Deus pensou para o ser humano. Ele é o homem perfeito porque realiza plenamente a sua humanidade. Assim, olhando para Jesus vislumbramos o mistério daquilo que somos e a vocação para a qual fomos chamados: “Cristo, novo Adão, na própria revelação do mistério do Pai e do seu amor, revela o homem a si mesmo e descobre-lhe a sua vocação sublime” (GS 22). Toda a vida de Jesus foi resposta ao plano de amor do Pai. Essa resposta se traduziu concretamente na adesão livre à sua vontade e no serviço libertador em prol dos homens e mulheres de seu tempo, reconduzindo-os ao amor misericordioso de Deus Pai. A nossa vocação é, portanto, cristológica, pois Cristo é o caminho por meio do qual podemos chegar a nossa humanidade plena. No dia do nosso Batismo, fomos incorporados a Cristo pelo Espírito Santo. Passamos a participar da comunhão de amor entre o Pai e o Filho. Deste modo, a nossa vida que já era dom do amor de Deus, foi marcada definitivamente por este amor. Nada nem ninguém podem apagar este selo do amor em nós. Assim, o Batismo visibiliza essa destinação a qual fomos chamados e abre-nos o caminho para realizá-la. O caminho é o próprio Jesus, ou melhor, o seu seguimento, realizado em Igreja, isto é, na companhia dos irmãos. Esse dado é muito importante porque nos faz perceber que a vocação não é algo que se refere apenas ao âmbito individual, mas deve ser assumida e vivida no serviço amoroso aos irmãos, numa comunidade de irmãos. Cada vocação específica na comunidade eclesial é um modo concreto de encarnarmos nossa resposta ao amor do Pai. Assim, o presbítero (padre) por sua dedicação exclusiva ao Povo de Deus; o religioso(a) por sua consagração a Deus e dedicação livre e gratuita aos irmãos;

o(a) esposo(a) por sua entrega amorosa ao cônjuge e no empenho por construir uma comunidade familiar; ou o leigo(a) que atuando nos diversos âmbitos sociedade, profissionalmente ou não, contribui para a edificação da civilização do amor, são respostas concretas a esta vocação originária ao amor que nos atrai e nos impulsiona. Pode acontecer que nos equivoquemos quanto ao modo de encarnar a resposta (o estado de vida), mas fundamental é permanecer na busca para oferecer uma resposta que traduza verdadeiramente o mistério do amor em nós. Diante desse mistério originário que o abarca, o ser humano é chamado a responder a esse mistério do amor, amando. A vocação é a expressão concreta desta resposta que acontece na liberdade e generosidade do coração, bem como nos possibilita construir uma história de amor, a nossa própria história, que vai sendo tecida em cada escolha e abertura ao dom do amor.

Fráter Rodrigo Costa, C.Ss.R


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