Na Ceia de despedida de Jesus com seus discípulos, antes de se entregar livremente para sofrer a morte violenta, Jesus institui a Eucaristia como memorial permanente de sua entrega amorosa em favor da humanidade. A Eucaristia é o ápice da pró-existência de Jesus, parábola de uma vida plenamente doada em prol do próximo. De fato, ao instituir o sacramento do Seu corpo e do seu sangue, já se realizou em figura aquilo que se consumaria na morte de cruz. Aqueles que se aproximam do Banquete Eucarístico entram em comunhão com o mistério da autodoação de Jesus, e se comprometem a assumir o mesmo compromisso de fazer da vida uma constante doação aos irmãos.
Pelo sacramento da Eucaristia, Cristo está constantemente se oferecendo a nós, comunicando-se a Si mesmo. Ao instituir o Sacramento do Amor, Jesus promete aos seus seguidores que sua “existência para” e “entrega por” será uma realidade permanente na vida de sua Igreja. Assim, cada vez que recebemos o corpo e o sangue do Senhor nos alimentamos desta presença que anima e faz viver. Isso é fundamental para redescobrirmos o sentido primeiro da Eucaristia, pois esta não nos foi dada para que a adorássemos em primeiro lugar, mas para que nos alimentemos: “Tomai e comei, isto é o meu Corpo”; “Tomai e bebei, esse é o cálice do meu Sangue a ser derramado por vós e por todos”. As duas súplicas que pedimos ao Espírito Santo na Oração Eucarística, a saber: a transformação das espécies do pão e do vinho no Corpo e no Sangue do Senhor e a nossa transformação no corpo eclesial de Cristo, mediante a comunhão no seu corpo sacramental, nos ajuda a compreender o sentido originário da Eucaristia. Não se trata, porém, de um pão cotidiano, que sacia a nossa fome física, mas do pão que dá vida ao mundo (Jo 6,51), e que sacia a nossa fome mais profunda: “Quem realmente come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna e Eu hei de ressuscitá-lo no último dia, porque minha carne é verdadeira comida e o meu sangue, verdadeira bebida” (Jo 6,54).
Alimentamo-nos da própria vida de Jesus Cristo para sermos no mundo sinais e testemunhas de sua presença, para que sua existência doada continue sendo oferecida aos seres humanos de todos os tempos, através da nossa vida cristã. Trata-se de viver uma vida eucarística, ou seja, uma vida permanentemente dada e partilhada em favor dos irmãos, pois “a Eucaristia arrasta-nos no ato oblativo de Jesus. Não é só de modo estático que recebemos o Logos encarnado, mas ficamos envolvidos na dinâmica de sua doação’. Ele ‘arrastanos para dentro de si’” (Bento XVI). Daí decorrem as consequências profundas de nossa participação na comunhão eucarística, pois a Eucaristia não é um anestésico para pacificar nosso coração, como às vezes se pensa, mas ao dizermos “Amém” para a declaração “O Corpo de Cristo”, estamos não só recebendo a presença de Jesus em nós, mas nos comprometendo a viver uma vida semelhante a sua, traduzida em amor e serviço aos irmãos. Nesse sentido, o gesto do “Lava-pés”, realizado na Última Ceia, é uma bela e eloquente imagem de uma vida verdadeiramente eucarística.
Comungando do Corpo e Sangue do Senhor, a Igreja se compromete a ser comunidade de serviço, “porque comendo o corpo entregue, deve tornar-se pela força que ele comunica, corpo-eclesial-entregue, corpo-para -os-outros, corpo-oferecido-pelas-multidões” (Bruno Forte). “Comungar é tornar-se um perigo” para os valores deste mundo, pois implica assumir na própria vida o mistério da auto-doação de Jesus, que implica se pautar pela lei do amor e do serviço desinteressado aos mais pobres. Que nossa comunhão seja realizada com convicção e que a Eucaristia nos fortaleça para sermos, também, alimento de vida para a fome do mundo.
Fráter Rodrigo Costa, C.Ss.R.